O impacto da PEC emergencial: cortes salariais e os limites do poço

Aprovada pelo Senado em meio à maior crise sanitária da história recente, a PEC emergencial impõe sacrifícios desproporcionais a servidores públicos enquanto mantém privilégios intocados.

Em uma votação que expôs as prioridades do parlamento brasileiro, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) emergencial foi aprovada ontem no Senado por 62 votos a favor e 16 contra, todos de partidos de esquerda. O ponto mais polêmico da PEC é a autorização para reduzir em até 25% os salários de servidores públicos, medida que atinge diretamente categorias como enfermeiros, médicos e outros profissionais da saúde, pilares do combate à pandemia.

O contraste é gritante: enquanto os salários de quem está na linha de frente do enfrentamento à COVID-19 são reduzidos, os vencimentos de parlamentares permanecem intactos. Em um cenário de recordes diários de mortes – 1.910 apenas ontem –, essa decisão é um tapa na cara dos trabalhadores e da população em geral.

A justificativa oficial para a medida se ancora no discurso de austeridade e no chamado “terrorismo fiscal”, que insiste na narrativa de que o governo “não tem dinheiro” para sustentar medidas como o auxílio emergencial. No entanto, esse argumento desmorona diante de fatos: em 2020, o governo aprovou crédito extraordinário de quase R$ 1 trilhão sem gerar efeitos inflacionários significativos. As pressões inflacionárias recentes, como no caso do arroz e dos combustíveis, têm origem em fatores externos e estruturais, não em gastos públicos excessivos.

Enquanto isso, a gestão da pandemia continua marcada pela negligência. Milhões de brasileiros são obrigados a trabalhar em condições precárias, sem auxílio suficiente para sobreviver a um lockdown que nunca veio. A vacinação avança a passos lentos, prejudicada pela falta de coordenação federal, e o Brasil segue mergulhado em um ciclo de mortes evitáveis.

A passividade dos sindicatos diante de um ataque tão grave também é alarmante. Salvo manifestações pontuais, o silêncio e a inação predominam, contribuindo para a desmobilização popular. O discurso centrista, que iguala esquerda e direita, ajuda a perpetuar essa paralisia, ignorando que as poucas vozes em defesa da vida e do trabalho têm vindo invariavelmente de setores progressistas.

O fundo do poço parece estar cada vez mais próximo, mas ainda não se sabe onde termina. A indiferença generalizada diante de tamanhas perdas – tanto humanas quanto sociais – é um reflexo de tempos sombrios, onde a tragédia é normalizada e as soluções parecem cada vez mais distantes.

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