UM CRUSH PARA O NATAL

A primeira comédia natalina gay se pretende ser progressista, mas se perde um pouco no tradicional.

Divulgação do filme Um Crush Para o Natal. Fonte: Banco de imagens Netflix

Depois de uma longa tradição cinematográfica natalina focada em famílias brancas e heterossexuais, realizadores contemporâneos, movidos pela fragmentação do público consumidor e também engajados com as lutas sociais empreendidas nos últimos anos resolveram investir mais em tramas sobre o festejo anual mais famoso do mundo, agora capitaneando outras possibilidades com protagonistas negros e homossexuais, antes relegados ao papel de coadjuvantes ou meras figuras ilustrativas de passagem.

Ainda com forte presença na indústria, o esquema hollywoodiano natalino mantém a sua presença firme anualmente, seja nos cinemas ou em telefilmes, mas há, cada vez maior espaço, para versões que podemos considerar alternativas.

Com isso, temos Um Crush Para o Natal como exemplar que propõe um ponto de vista, digamos, progressista, mas com estrutura narrativa que infelizmente ainda é bastante tradicional e focada nos padrões estabelecidos pelo esquema que tenta enfrentar.

A sensação que se tem ao terminar a comédia romântica é a de falta de ritmo mais dinâmico e também de ousadia dos realizadores, muito tímidos diante de uma abordagem que poderia render excelentes momentos não apenas de entretenimento, mas também de crítica sociopolítica firme e necessária para o atual momento de crescimento vertiginoso de casos de homofobia, mesmo com as tantas conquistas civis recentes.

Ao longo de seus 99 minutos, contemplamos a jornada de Peter (Michael Urie), jovem que trabalha em Los Angeles no ramo das mídias sociais e precisa arrumar um namorado para os eventos de final de ano na casa de sua família.

Ele não quer ser alvo da cobrança e das piadas jocosas de todos os integrantes do lar, cada um já devidamente estabelecido com seus relacionamentos. Após um encontro equivocado com um médico sedutor e atraente, não lhe restam muitas opções. Será preciso, mesmo que de mentira, arrumar alguém para se passar por seu companheiro, ao menos durante o breve, mas agitado período.

A solução surge com seu amigo, Nick (Philemon Chambers), jovem que atua como escritor e também realiza trabalhos diversos para se manter. Eles dividem há algum tempo o apartamento e segue para os festejos natalinos juntos, como par romântico disfarçado.

As confusões começam quando ao chegar, Peter descobre que a sua mãe, Carole (Kath Najimy), marcou um encontro para o filho, desta vez, com o sedutor e belo instrutor de academia, James (Luke Macfarlane). Com isso, uma série de momentos cômicos se desdobram, mas de maneira interessante, os realizadores evitam a demonização da família, tal como ocorre com a maioria dos filmes natalinos.

Temos os clichês abundantes, incômodos e desnecessários, mas com exceção da tia que adora se aparecer e exibir os seus talentos artísticos de canto e dança, os demais personagens estão mais distantes dos estereótipos que a maioria das histórias do tipo.

Além disso, há um conflito inesperado para Peter: será que só ele não percebeu que possivelmente é mais que um amigo para Nick, algo confirmado por todos os seus familiares? É preciso assistir para compreender como a situação se desdobra, mas desde o começo, o final está óbvio.

Ademais, com referências constantes aos aplicativos de relacionamento gay e uma mãe que lê constante sobre o universo para se manter atualizada nas conversas com o seu filho, Um Crush Para o Natal é aquele filme divertido, cheio de boas intenções com o compromisso estabelecido ao retratar a trama por um prisma bem específico, mas falho por não escapar, tal como já mencionado, da padronização que este tipo de narrativa precisa para ser mais autêntica.

Faltou mais domínio dramático para Chad Hodge, roteirista responsável pela empreitada, pouco autentico, mesmo que não ofensivo. Ele entrega para o cineasta Michael Mayer um texto clean, humorado, mas nada subversivo, sem muita criatividade.

A sua equipe entra adequadamente no clima natalino, em especial, a trilha sonora de Anton Sanko e os elementos visuais edificados pela direção de fotografia e design de produção, assinados, respectivamente, por Eric Cayla e Grey Lalande, ambos responsáveis pela efusão de luzes, guirlandas, pinheiros e outros elementos que compõem a tradicional e atraente perspectiva cultural natalina.

Um Crush Para o Natal (Single All the Way, Canadá – 2021)
Direção: Michael Mayer
Roteiro: Chad Hodge

Elenco: Michael Urie, Philemon Chambers, Luke Macfarlane, Barry Bostwick, Jennifer Robertson, Madison Brydges, Alexandra Beaton
Duração: 99 min

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