Escândalo Proxalutamida: Fraudes Científicas e Mortes em Pesquisa

Nos últimos dias, a mídia tem dado destaque a um caso alarmante envolvendo o medicamento experimental proxalutamida, que foi testado como tratamento para a Covid-19. No entanto, a maneira como o medicamento foi utilizado não foi propriamente um “teste”, mas sim um conjunto de pseudoexperimentos que foram amplamente denunciados como fraudes científicas. O episódio traz à tona não apenas erros éticos e científicos, mas também graves violações, comparáveis aos descalabros que marcaram o escândalo da Prevent Senior.

A situação remonta a meses atrás, quando o caso foi inicialmente divulgado e causou grande repercussão. O mais recente desenvolvimento, no entanto, envolve uma declaração oficial da Unesco, que se manifestou a respeito das 200 mortes de voluntários que ocorreram durante uma pesquisa sobre a proxalutamida realizada no Amazonas. A Unesco reagiu a uma denúncia do Conep (Conselho Nacional de Ética em Pesquisa), que também levou o caso à Procuradoria-Geral da República. O relatório do Conep indicou uma série de falhas graves no protocolo da pesquisa, incluindo a desinformação dos pacientes sobre o fato de estarem participando de um experimento.

A pesquisa, que foi liderada pelo endocrinologista Flávio Cadegiani e patrocinada pela rede privada de hospitais Samel, contou com a participação de várias unidades hospitalares no Amazonas. O estudo envolveu o uso de medicamentos não autorizados, como cloroquina e outros tratamentos experimentais. Há denúncias de que pacientes não foram informados adequadamente sobre os riscos do estudo e que, apesar de eventos graves e até mortes, o experimento continuou sendo realizado, desconsiderando as normas éticas e de segurança necessárias para esse tipo de pesquisa.

Flávio Cadegiani, o responsável pelo estudo, nega as acusações e insiste que o tratamento proposto tinha respaldo científico, mas não esconde suas ligações com o movimento do “tratamento precoce”, que defendia o uso de medicamentos ineficazes, como a cloroquina, no combate à Covid-19. Ele também foi um dos defensores do aplicativo TrateCov, que indicava o uso desses remédios sem qualquer comprovação científica. O fato de Cadegiani estar tão intimamente ligado a essas iniciativas, que foram amplamente desacreditadas, levanta sérias dúvidas sobre a integridade de sua pesquisa e sobre as intenções por trás de suas ações.

O comunicado da Unesco sobre o caso foi enfático ao afirmar que não há justificativa para as práticas denunciadas, nem do ponto de vista da emergência sanitária nem do ponto de vista político. A organização internacional enfatizou a necessidade de responsabilização não apenas ética, mas também legal, de todos os envolvidos, desde as equipes de investigação até as instituições e patrocinadores que financiaram a pesquisa, incluindo atores nacionais e internacionais.

É importante lembrar que o ex-presidente Jair Bolsonaro esteve diretamente envolvido na promoção do medicamento proxalutamida. Em março de 2021, ele declarou publicamente seu interesse pelo medicamento, que ainda estava em fase experimental, o que reforça a acusação de que a gestão da pandemia foi marcada por uma mistura de negacionismo, pseudociência e interesses econômicos. O uso da proxalutamida em diversos estados e cidades, apesar da falta de comprovação científica, é um reflexo dessa estratégia.

Com a revelação das 200 mortes e a possibilidade de que o número real seja ainda maior, o caso se torna um dos exemplos mais graves de negligência médica e científica durante a pandemia. A combinação de falhas éticas, a busca por lucros com medicamentos não comprovados e a conivência de profissionais da saúde geraram um cenário desastroso, com consequências irreparáveis para muitas famílias.

Este episódio evidencia a necessidade urgente de uma comissão da verdade sobre a pandemia. Assim como outros momentos sombrios da história, é fundamental que se investigue e se responsabilize aqueles que, por omissão ou ação direta, contribuíram para a tragédia que ainda assola o país. O que está em jogo não é apenas a apuração dos fatos, mas também a busca por justiça para as vítimas e a prevenção de que algo semelhante jamais se repita.

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