A percepção pública e as políticas em curso mostram avanços e contradições na gestão da Covid-19
Uma pesquisa recente do Datafolha revelou as opiniões dos brasileiros sobre o controle da pandemia. Enquanto 9% acreditam que a situação está totalmente sob controle, 71% consideram que está parcialmente controlada, e 20% avaliam que ainda está fora de controle. Opto por me alinhar ao grupo dos 20%, pois os dados e a realidade indicam que ainda há um longo caminho para uma gestão eficaz da crise sanitária.
Vacinação e queda na média móvel de mortes: mérito da ciência
É verdade que a queda na média móvel de mortes tem sido observada recentemente, reflexo direto do avanço da vacinação e, possivelmente, do ciclo natural da doença. No entanto, associar essa tendência à ideia de controle é equivocado. Controle pressupõe uma ação coordenada e abrangente sobre os fatores que influenciam a pandemia, algo que ainda não ocorre no Brasil.
Desafios na vigilância epidemiológica
Uma das maiores lacunas é a ausência de uma vigilância genômica robusta. Não sabemos a prevalência exata da variante delta ou de outras variantes em estados e municípios. Além disso, o país não realiza testes em massa, rastreamento de contatos nem isolamento adequado. A vacinação, pilar essencial no combate à Covid-19, também apresenta disparidades regionais significativas: estados como São Paulo vacinaram mais que o dobro da população de Roraima com a segunda dose.
A adesão ao uso de máscaras: um ponto positivo
Outro dado animador da pesquisa é o apoio massivo ao uso de máscaras, com 91% defendendo sua obrigatoriedade enquanto a pandemia não estiver controlada. Esse número é notável, considerando as dificuldades históricas do Brasil em campanhas de conscientização e distribuição de máscaras. Apesar da ausência de ações sistemáticas por parte dos governos, o movimento antimáscara não ganhou força, mostrando um comprometimento individual da população.
Máscaras e vacinação: pilares negligenciados
Controlar a pandemia exige ações concretas, como a distribuição de máscaras de qualidade em larga escala. Essa medida teria um impacto direto na redução da propagação do vírus. No entanto, a falta de políticas consistentes nesse sentido reflete um padrão de inação e decisões equivocadas. Um exemplo claro foi a suspensão temporária da vacinação de adolescentes, revertida posteriormente pelo STF.
Decisões políticas e a liberação de eventos de massa
A decisão do governo de São Paulo de liberar torcida nos estádios para jogos de futebol é emblemática. A partir de 1º de novembro, está prevista a ocupação total, precedida por liberações parciais em outubro. A medida parece apressada e motivada mais por pressões econômicas e políticas do que por evidências científicas. Em um momento em que o controle ainda não é efetivo, tais flexibilizações podem gerar novos surtos e comprometer os avanços alcançados.
Reflexões finais: entre o avanço e a negligência
Embora o Brasil tenha motivos para comemorar os avanços na vacinação e a queda nas mortes, é prematuro falar em controle da pandemia. A falta de coordenação nacional, disparidades regionais e decisões contraditórias continuam a colocar o país em uma posição vulnerável. Para alcançar um verdadeiro controle, é essencial investir em vigilância, uniformizar a vacinação e implementar medidas de proteção abrangentes, como a distribuição de máscaras e campanhas educativas. Sem essas ações, o risco de retrocesso permanece alto.