O país enfrenta um escândalo de insumos vencidos que expõe falhas na gestão e desmonte do SUS
O Ministério da Saúde do Brasil está no centro de um escândalo envolvendo o desperdício de insumos de saúde, que incluem medicamentos, vacinas e testes de diagnóstico, como os PCRs para COVID-19. Estima-se que os itens vencidos totalizem 242 milhões de reais, somando cerca de 3,7 milhões de itens que começaram a vencer em 2018, no governo Temer, mas que a maioria expirou durante o governo Bolsonaro.
A informação sobre o acúmulo de insumos vencidos foi mantida em sigilo por artifícios administrativos. No entanto, a regra do estado de direito exige transparência, exceto em questões de segurança nacional, e é justamente a transparência que assegura a segurança pública. O sigilo foi quebrado pelo jornal Folha de S.Paulo, que teve acesso a planilhas do ministério que detalham os itens vencidos, revelando dados alarmantes sobre o desperdício.
Entre os insumos vencidos, estão milhões de doses de vacinas, como as para gripe, BCG, hepatite B e varicela, além de medicamentos essenciais para o tratamento de diversas condições, como hepatite C, câncer, Parkinson, Alzheimer, doenças raras, esquizofrenia e problemas renais. O desperdício também inclui medicamentos de altíssimo custo, como a ampola de nusinersena, que custa 160 mil reais, e frascos de eculizumab, que totalizam 11,8 milhões de reais.
Em tempos de pandemia, cerca de 2 milhões de exames RT-PCR para COVID-19 também foram descartados, além de testes para diagnóstico de outras doenças como dengue, zika e chikungunya. A magnitude do desperdício é chocante, mas a justificativa dada pelo diretor do Departamento de Logística (Dlog) do Ministério da Saúde, general da reserva Ridauto Fernandes, causou indignação. Ele comparou a perda de validade dos insumos à rotina do comércio varejista, onde perdas são “embutidas” no preço final das mercadorias, desconsiderando que os insumos de saúde têm como objetivo salvar vidas.
A comparação do general Fernandes é desrespeitosa, pois a gestão pública de saúde não pode ser tratada como um simples comércio. Embora haja perdas em estoques por problemas logísticos ou vencimento de validade, o que se observa neste caso é um nível de incompetência administrativa que resulta em gestão criminosa, ou, no mínimo, improbidade administrativa. O desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS), iniciado no governo Temer e intensificado no governo Bolsonaro, agravou a situação, com a substituição de profissionais qualificados por indicações políticas e militares sem a expertise necessária.
O SUS, que sempre foi reconhecido mundialmente pela sua gestão eficiente, começou a perder sua capacidade de operação devido ao desfinanciamento e à infiltração de figuras políticas e militares em cargos-chave. O resultado é a perda de excelência na administração de saúde pública, com a gestão do ministério tornando-se um reflexo do desmantelamento da estrutura que antes funcionava de forma integrada e eficaz entre as esferas de governo. A tragédia que se desenha é a negligência com a vida das pessoas, e a sociedade brasileira merece respostas claras e ações responsáveis para evitar que esse tipo de gestão continue a comprometer a saúde pública.
Atualmente, o Brasil enfrenta mais de 1 milhão de casos ativos de COVID-19, com a vacinação avançando lentamente, ainda com 63,23% da população recebendo ao menos uma dose. Enquanto isso, o desperdício de insumos continua a expor as falhas de uma gestão que não tem compromisso com a saúde da população.