Anvisa interdita 12 milhões de doses da CoronaVac e acirra a discussão sobre a segurança das vacinas contra a COVID-19
Nos últimos dias, a disputa entre o governo de São Paulo, através do Instituto Butantan, e o Ministério da Saúde ganhou destaque devido à decisão do ministério de priorizar as vacinas da Pfizer e AstraZeneca para a terceira dose, destinada a pessoas idosas e com problemas de imunidade. O governo paulista, por sua vez, interpretou a medida como uma tentativa de prejudicar a CoronaVac, alegando que os critérios adotados seriam políticos, em vez de baseados em evidências técnicas.
No entanto, uma matéria publicada no sábado (4) pelo jornal Folha de S.Paulo, assinada pela jornalista Ana Bottallo, parece encerrar o debate e dar razão ao Ministério da Saúde. A reportagem apresenta declarações de renomados cientistas e especialistas em saúde pública que confirmam que a decisão do ministério foi tomada com base em análises técnicas. O texto também destaca que o grupo assessor do ministério é formado por representantes de entidades respeitadas, como a Sociedade Brasileira de Infectologia, a Sociedade Brasileira de Imunizações, o Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e o Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), evidenciando a seriedade e a pluralidade da análise.
De acordo com o grupo técnico, as vantagens do esquema vacinal heterólogo (uso de diferentes vacinas na primeira e terceira doses) são amplamente reconhecidas. A Pfizer, por exemplo, utiliza tecnologia de RNA mensageiro, enquanto a AstraZeneca faz uso de um adenovírus de gripe, e a CoronaVac usa o próprio coronavírus desativado. Como a maioria dos brasileiros foi vacinada com a CoronaVac na primeira etapa da campanha, a recomendação de heteroimunização, ou seja, a aplicação de outra vacina na terceira dose, teria como opções naturais a Pfizer ou a AstraZeneca. Diversos especialistas citados pela reportagem indicam a Pfizer como a mais indicada, respaldados por estudos científicos.
Vale destacar que a discussão não envolve a desvalorização da CoronaVac, que desempenhou um papel fundamental no início da campanha de vacinação no Brasil, ajudando a salvar muitas vidas. Contudo, a polêmica ganhou novos contornos quando, na mesma edição, a Folha de S.Paulo noticiou que a Anvisa interditou o uso de cerca de 12 milhões de doses da CoronaVac produzidas por um laboratório chinês não inspecionado. A princípio, essas doses poderiam ser liberadas para uso futuro, caso cumpram os requisitos de segurança, mas a medida acirrou ainda mais as críticas em relação à vacina.
O Instituto Butantan, responsável pela produção da CoronaVac no Brasil, comunicou à Anvisa sobre a situação, afirmando que o fez “por compromisso com a transparência e por extrema precaução”. Entretanto, a situação levantou questões sobre como o imunizante foi importado de um laboratório não certificado pela agência reguladora, o que gerou insegurança e questionamentos sobre a gestão do processo.
Esse novo episódio, somado à guerra de narrativas entre os governos de São Paulo e o federal, certamente resultará em atrasos na vacinação e poderá prejudicar ainda mais a confiança da população nas vacinas. Embora as divergências políticas tenham sido um fator importante nesse conflito, o maior impacto vem da falha administrativa, com erros que enfraquecem a credibilidade do processo e ampliam a incerteza entre os cidadãos.
Atualmente, 62,90% da população brasileira recebeu ao menos uma dose da vacina contra a COVID-19, e 31,34% da população está completamente imunizada. Contudo, os avanços da campanha de vacinação podem ser prejudicados pela falta de coordenação e pelo desgaste das políticas públicas, resultando em mais desafios no combate à pandemia.