Eu tenho a força! Só que não

Que homens cuidam menos da saúde, já sabíamos. Resistem em ir ao médico, tendem a aderir menos a tratamentos prolongados e crônicos, têm mais hipertensão e doenças cardiovasculares e até mesmo se recusam ou adiam o quanto podem para o toque retal do exame de próstata. O machismo cobrando seu preço.

Que isso poderia ter impacto na mortalidade pela Covid-19, por conta das chamadas comorbidades mais presentes nos homens, suspeitava-se desde o início, diria Chapolin. Também, na conta do viés de comportamentos, há maior tendência de os homens não manterem os cuidados específicos contra o vírus, tipo higiene e uso de máscara. Homens tiram mais a máscara, deixam de usar mais frequentemente e usam mais de forma errada.

De fato, os dados do Ministério da Saúde indicam mais mortes e casos graves de homens, mas também tem outros recortes. Morrem mais pobres, mais homens negros, há alta mortalidade em setores como trabalhadores do transporte, entregadores de aplicativos, frigoríficos, todos que tem como características empregarem majoritariamente.

Ou seja, há uma quantidade enorme de variáveis que dificultam bastante o estabelecimento da relação de causa e efeito, ao menos de forma definitiva ou facilmente identificável. Mas, para complicar, multiplicam-se estudos que apontam causas orgânicas, ou melhor, genéticas, que incidem tanto no contágio como na mortalidade maior dos homens.

É o caso do estudo feito por pesquisadores do Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (CEGH-CEL) e publicado na plataforma medRxiv que concluiu que os homens são capazes de transmitirem mais e se infectam com maior facilidade com o vírus da Covid-19. Além disso, o sexo masculino também possui mais chances de apresentar quadros graves da doença.

Tentando evitar os muitos vieses comportamentais que mencionei, a escolha foi analisar a transmissão do vírus em casais, mais de mil, que moravam juntos no período da transmissão e não adotavam medidas de proteção. Direto para a conclusão, o que se revelou é que os homens foram os primeiros ou únicos infectados na maioria dos casos, tanto entre casais em que ambos adoeceram como nos que somente um adoeceu.

Entendo que é possível que sim, haja diferenças genéticas, anatômicas, comportamentais, sociais, que explicam diferenças entre grupos e populações no que se refere a gravidade do quadro e a mortalidade. A doença é bem nova e, em boa medida, considero que mais complexa e mais surpreendente do que era razoável supor.

Há de se seguir o esforço de compreender a doença em suas muitas dimensões, mas as desigualdades sociais de acesso, inclusive entre nações, têm definido muito mais o sucesso e o insucesso no combate à pandemia, como fica explícito quando observamos a oferta de vacinas e outros insumos para cuidado.

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