Pandemia: abusou da regra três

Segundo o pesquisador da Fiocruz, Rodrigo Stabeli, (a) “terceira dose é quando o esquema vacinal não se completa, quando o objetivo vacinal (produção da resposta imune conforme previsto nos estudos) ainda não foi alcançado”. Ou seja, quando estamos falando de terceira dose, estamos pressupondo que houve um déficit que precisa ser suprido.

Ainda segundo Stabelli, o alvo dessa vacinação seriam as “pessoas imunossuprimidas (pacientes que nasceram ou adquiriram doenças que abalam o sistema imune, como câncer, HIV e outras) que necessitam de um complemento para ter a mesma resposta imunológica esperada para outros públicos”.

Esse conceito difere do REFORÇO VACINAL ou dose de reforço, que visa manter a imunidade já adquirida em pessoas que tiveram o esquema vacinal completo, tiveram resposta imunológica adequada ou esperada e com o reforço reativam a produção de anticorpos facilitando a imunidade contra novas cepas.

Independente das nomenclaturas, me parece que o importante é pensar que são duas estratégias para situações distintas. Uma diz respeito a vacinar até “pegar”, é emergencial pois, se a pessoa nem atingiu a imunidade esperada, ela entra no grupo prioritário, como se não tivesse ainda sido vacinada, daí se dá mais uma dose, no caso da Covid-19, a terceira.

No outro caso não há urgência, a vacina “pegou” conforme o previsto ou o aceitável em termos de proteção coletiva, por isso completa-se o esquema vacinal na população toda (na verdade 70% a 80% da população vacinável) e depois se organiza a vacinação de manutenção, seja lá que nome se dará.

Acontece que o Brasil vacinou apenas 27% com duas doses e não faz sentido massificar a terceira dose. O mais adequado é apressar a segunda dose e depois organizar uma espécie de PNI parte 2. Lembrando sempre que para populações especiais pelo déficit imunológico, a terceira dose ainda é o plano 1.

Moro num estado que está entre os 3 que mais vacinaram (SP), mas penso que a ênfase do debate seria a busca de equalização da vacinação. É absurdo ter cidades com 12% e outras com 35% de vacinados em segunda dose. Isso é moralmente condenável e sanitariamente não sustentável pelas características do vírus, particularmente a variante Delta, que segue circulando mesmo entre pessoas imunizadas.

Anúncios bombásticos de recordes de vacinação me parecem estar na lógica de “performar”. O recorde de São Paulo, por exemplo, é em comparação a outros estados que vacinam pouco. Penso que todos “performariam” melhor se estivessem analisando os gargalos e coletivamente incidindo sobre eles, afinal o plano é nacional.

Ainda sobre a terceira dose, sabemos que Chile, Uruguai e Israel, como exemplos, estão caminhando para generalizar a terceira dose. Mas todos esses países atingiram índices superiores a 70% de vacinados completamente. Não se trataria, portanto, de transpor estratégias para parecer o gestor mais avançado.

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