Vacinação contra a Covid-19: A Necessidade de Equilíbrio entre Primeira, Segunda e Terceira Dose

O Brasil precisa focar no avanço da segunda dose antes de massificar a terceira dose, buscando equalizar a vacinação entre estados e municípios

A discussão sobre a terceira dose da vacina contra a Covid-19 tem gerado diferentes interpretações no Brasil. De acordo com o pesquisador da Fiocruz, Rodrigo Stabeli, a terceira dose é necessária quando o esquema vacinal não é completo, ou seja, quando a resposta imunológica esperada não foi alcançada. Em casos de pessoas imunossuprimidas, como pacientes com câncer ou HIV, é preciso um complemento para garantir que sua resposta imunológica seja adequada, assim como os demais grupos da população.

Stabeli explica que a terceira dose tem um objetivo distinto do reforço vacinal, que visa manter a imunidade já adquirida, reativando a produção de anticorpos e facilitando a proteção contra novas cepas do vírus. A estratégia da terceira dose está associada à urgência de suprir um déficit imunológico, enquanto a dose de reforço é uma medida preventiva para manter a eficácia da vacina ao longo do tempo.

No entanto, o Brasil enfrenta uma situação complexa em relação à vacinação, com apenas 27% da população totalmente imunizada, ou seja, com as duas doses. Esse cenário torna a massificação da terceira dose inadequada, pois o foco deveria estar em concluir a vacinação da população com a segunda dose. A prioridade deveria ser apressar a segunda dose e, após isso, pensar em um “PNI parte 2” para completar o esquema vacinal da população e, posteriormente, organizar a vacinação de manutenção.

Em São Paulo, estado que está entre os três mais avançados na vacinação, o debate sobre a terceira dose precisa ser equilibrado com a realidade da vacinação desigual entre os municípios. É inaceitável que cidades tenham apenas 12% da população vacinada com a segunda dose, enquanto outras chegam a 35%. Essa disparidade é um reflexo da descoordenação na aplicação da vacina, o que coloca em risco a saúde pública, especialmente com a circulação da variante Delta, que segue afetando pessoas mesmo com vacinação parcial.

Os números de recordes de vacinação, muitas vezes anunciados de forma bombástica, são, em muitos casos, apenas comparações com estados onde o ritmo de vacinação é mais lento. No entanto, esse tipo de “performace” não contribui para o objetivo real da vacinação, que é a proteção coletiva. O Brasil precisa focar nos gargalos que ainda existem na vacinação e trabalhar de maneira coordenada e integrada entre os estados e municípios para garantir a imunização completa da população.

Exemplos de países como Chile, Uruguai e Israel, que já avançaram na terceira dose após vacinarem mais de 70% de suas populações, são estratégias que podem ser adaptadas para o Brasil, mas sempre respeitando o contexto local. O modelo brasileiro não pode ser impulsionado por uma lógica de “desempenho”, mas sim por uma análise criteriosa das necessidades da população e da realidade das vacinas disponíveis.

Em suma, a estratégia de vacinação no Brasil deve ser ajustada para priorizar a segunda dose e garantir a equalização da vacinação entre estados e municípios, além de considerar a aplicação da terceira dose apenas em populações especiais que necessitam de um reforço, como os imunossuprimidos.

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