A variante Delta e a terceira onda

Ontem (4) completamos o 200º (ducentésimo) dia de campanha de vacinação contra a Covid-19. Foram cerca de 148 milhões de doses de vacinas inoculadas, o que dá uma média de 740 mil vacinas por dia. Falando assim, parece muita coisa, mas não é bem assim.

O problema é que estamos tentando vacinar algo como 160 milhões de pessoas e consolidar o que se chama de imunidade comunitária, capaz de proteger o conjunto da população da infecção e controlar definitivamente a transmissão epidêmica.

Considerando que quase a totalidade dos imunizantes que temos disponíveis e ou contratados necessitam de duas doses para a imunização completa, demandamos quase 320 milhões de doses inoculadas, ou seja, andamos menos da metade do caminho.

Apesar do que o Ministério da Saúde tenta nos fazer crer, a vacinação é lenta. Quando olhamos o total de vacinas, o Brasil está em 4º lugar, perdendo apenas da China, Índia e EUA. Mas quando olhamos o percentual da população vacinada, observamos mais de 60 países na nossa frente e há entre esses países os que são ricos, pobres, pequenos, grandes e que estão na América Latina, Ásia, Europa e Oceania.

A péssima notícia é que essa demora não tem a ver com nossa capacidade de vacinar, que facilmente chegaria a 2 milhões por dia. O gargalo está na disponibilidade de doses e todos sabemos o porquê.

Foi a condução criminosa de Bolsonaro e seu Ministério da Saúde, infelizmente muito bem-sucedida para o que pretendeu, gerando mortes e pessoas sequeladas como ninguém seria capaz de imaginar, nem no mais terrível pesadelo.

Mas isso acontece a tanto tempo, que temo pelo pior. Meu medo é que impere uma naturalização desse estado de coisas. Vejam, julho deste ano morreu quase 20% mais pessoas pela pandemia do que julho de 2020 (pior mês da chamada primeira onda).

Mesmo assim foi possível ver uma onda de otimismo que ensejou inclusive flexibilização de medidas sanitárias. Não foram poucos que comemoraram a queda dos números pandêmicos, apesar dessa “queda” ser para números elevadíssimos, ainda superiores aos da pior fase da onda anterior, parecendo aquela famosa estratégia do segundo bode na sala.

Não cabe otimismo, assevero, como também assevera hoje Wellington Dias (PT), coordenador da temática ‘Estratégia para vacinação contra Covid-19’, representando o Fórum Nacional de Governadores, que assim se manifestou em carta ao ministro Queiroga:

“Os governadores expressam preocupação com a eventual 3ª onda, resultando em aumento do número de óbitos e infectados no País, que teria o Rio de Janeiro como principal epicentro de disseminação da nova variante, a qual vem apresentando a característica de ser 100% mais contagiosa do que a cepa originária e 30% em relação à variante P1”, diz a carta, com base em alertas de especialistas em infectologia.

Em se tratando de variante Delta o caso do Reino Unido é paradigmático. Com quase 60% da população com esquema vacinal completo, a chegada da Delta fez avançar de forma contundente a média móvel de novos casos. Felizmente a vacina, mais uma vez, se mostrou eficaz, e as mortes não acompanharam o aumento de casos.

Mas houve sim aumento de mortes que, de um patamar muito baixo (menos de 10 mortes por dia), subiu para mais de 80 mortes. Isso, insisto, com 60% de pessoas imunizadas. Como será aqui em que apenas 21% da população está imunizada?

Na referida carta ao ministro, os governadores dizem ainda que o Ministério da Saúde deve oferecer “ações imediatas” para “evitar uma catástrofe de proporções ainda mais graves no futuro próximo”. Mas temo que encontrará resposta nenhuma, a não ser (no máximo) a retórica de que “estamos trabalhando duro” e outros escapismos do gênero.

O concreto seria para já, mais vacinas, muito mais, dentro de um pacto de união nacional contra o vírus, com ações para além da vacina, como isolamento, testagem, distribuição massiva de máscaras de qualidade e um alerta nacional de emergência sanitária que pudesse de fato despertar a preocupação na sociedade proporcional ao perigo e servisse como enfrentamento aos gestores negacionistas e de fator de proteção aos que não são negacionistas, mas sofrem todo tipo de pressão quando tentam agir.

No início da CPI da pandemia cheguei a pensar que essa remota possibilidade teria alguma chance, mas não acredito mais. Acho que todas as pessoas e instituições que seguem apontando saídas o fazem quase como registro de marcos para que um dia possamos avaliar o que deveria e o que de fato foi feito, para que um dia esses genocidas sejam responsabilizados.

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