Suspensão de Resolução e Acolhimento de Adolescentes: Decisão Importante na Proteção dos Direitos Humanos

Decisão da Justiça Federal destaca a responsabilidade do Estado e do Sistema de Saúde no atendimento a adolescentes com sofrimento ou transtorno mental, afastando práticas que colocam em risco a saúde e os direitos dessa população vulnerável.

A decisão da Juíza Federal Titular da 12ª Vara de Pernambuco, Joana Carolina Lins Pereira, em caráter liminar, representou um passo significativo na defesa dos direitos de adolescentes em comunidades terapêuticas. A liminar suspende a Resolução nº 3/2020 do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (CONAD), que tratava do acolhimento de adolescentes em comunidades terapêuticas, suspendendo o acolhimento de qualquer novo adolescente e determinando o desligamento dos que já se encontravam nessas instituições.

A decisão impõe um prazo de 90 dias para que o Ministério da Saúde assegure o atendimento regular desses adolescentes, conforme os preceitos da Portaria nº 3.088/2011, que estabelece a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no Sistema Único de Saúde (SUS). Essa portaria, que tem como objetivo o atendimento a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de substâncias, deve ser a base para o atendimento a esses jovens, afastando o modelo de comunidades terapêuticas, que tem sido alvo de críticas por suas condições e pela falta de um acompanhamento adequado.

A juíza também determinou a suspensão do financiamento federal a novas vagas em comunidades terapêuticas, com exceção do custeio necessário para a manutenção dos adolescentes já acolhidos, até o seu desligamento. A medida visa garantir que os recursos públicos sejam direcionados para o atendimento mais adequado e em conformidade com os direitos humanos.

Análise da Defesa e da Contradição na Argumentação da AGU

No entanto, a defesa da manutenção da Resolução do CONAD, apresentada pela Advocacia Geral da União (AGU), apresentou falhas que foram decisivas para a decisão liminar. A AGU argumentou que a resolução estava em vigor há cerca de um ano, o que, segundo sua interpretação, desqualificaria a urgência da decisão liminar. Porém, a própria resolução estabelecia que seus efeitos só passariam a valer um ano após sua publicação, o que indica que a defesa estava equivocada ao afirmar que a resolução já estava em vigor. Essa falha na argumentação evidenciou a inconsistência da defesa governamental.

Além disso, a AGU argumentou que havia 500 adolescentes já acolhidos nas comunidades terapêuticas, mas, conforme a resolução ainda não estava em vigor, não seria possível que esses adolescentes estivessem acolhidos com base nela. Essa contradição foi outro ponto crucial que levou à suspensão da resolução e ao entendimento de que a defesa não estava fundamentada de maneira adequada.

Importância da Decisão e o Papel da Sociedade Civil

Essa decisão não apenas suspende uma resolução que vulnerabilizava ainda mais os adolescentes em situação de risco, mas também reafirma a importância de um modelo de atendimento voltado para a saúde mental e os direitos humanos. A luta de entidades da sociedade civil e de órgãos de defesa dos direitos humanos, como a Defensoria Pública da União (DPU), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), o Conselho Federal de Psicologia (CFP), e outras organizações, foi fundamental para essa vitória, que demonstra a força da mobilização e a importância da fiscalização das políticas públicas em defesa dos mais vulneráveis.

O relatório da inspeção do CFP nas comunidades terapêuticas de 2018, que foi citado na decisão, também evidenciou as condições precárias e a falta de um atendimento adequado nas instituições que deveriam cuidar da saúde mental e do bem-estar dos adolescentes. A decisão judicial agora abre caminho para que esses adolescentes possam ser realocadas para um ambiente mais seguro e com apoio psicológico adequado, em consonância com os direitos fundamentais garantidos pela Constituição e tratados internacionais.

Próximos Passos

A medida liminar representa uma vitória para a proteção dos direitos dos adolescentes e para a luta contra práticas de encarceramento em comunidades terapêuticas. A continuidade da atuação das entidades da sociedade civil, junto com a fiscalização do Ministério da Saúde e da Defensoria Pública, será essencial para garantir a implementação efetiva da decisão e o respeito aos direitos desses jovens, para que possam receber o atendimento necessário e se reintegrar de forma digna à sociedade.

A construção coletiva de soluções que respeitem a dignidade humana e a efetivação dos direitos sociais continua sendo o caminho mais seguro para que políticas públicas de saúde mental atendam as reais necessidades da população. A vitória da DPU e de outras entidades é apenas o início de um processo que exige vigilância constante e ações eficazes para que o modelo de acolhimento de adolescentes seja verdadeiramente humanizado e centrado na saúde e no bem-estar dos jovens.

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