O preconceito invertido por de baixo dos panos

A ideologia é algo muito louco. Grosso modo, é a forma de consciência que pega a realidade aparente e imediata e traduz como realidade concreta e natural. Por meio desse mecanismo, o particular é transformado em universal, e o injusto em justo.

Por exemplo, a verdade de que “todos nós somos seres humanos” seria a realidade aparente e imediata, óbvia por si só. Já o racismo, a homofobia, o machismo, a luta de classes etc. são a realidade concreta, ou seja, a realidade que apenas se revela na experiência. Por isso, essa realidade concreta também é a realidade mediata, isto é, que precisa da mediação social para ultrapassar o simples “estar aí” e adquirir uma forma real.

A grande questão é que a manifestação da ideologia por si só não possui discernimento e tem como base a mera ignorância. Por isso, não deve haver culpa sobre quem reproduz a ideologia. Ela só se desconstrói com o debate e com a democracia. No entanto, a militância pró-ideologia, a qual temos visto mais intensamente nos últimos tempos no Brasil e no mundo, é outra história. É reacionarismo mesmo.

Para o reacionarismo, todas as formas de desigualdades sociais, que seriam a realidade concreta, são lidas como seu inverso, isto é, como produto da ideia, que divide as pessoas e põe negros contra brancos, empregados contra seus patrões, LGBT contra heterossexuais, pessoas transgênero contra pessoas cis etc. De repente, falar de desigualdade social, desigualdade de gênero, desigualdade racial, que são coisas próprias da experiência humana, transforma-se em “ideologia” e é tratado como aquilo que perverte a realidade “concreta” da paz e da igualdade, que de concreta não tem nada.

O que quero dizer é que essa corrente de “Escola sem partido” e combate a “ideologia de gênero” tem nome. E chama-se má fé. Vem daqueles que têm consciência dessas desigualdades, mas que, em nome da verdadeira ideologia de que “todos somos iguais” (muito confortável para quem está no poder), buscam deslegitimar o discurso de quem está em baixo equiparando a sua experiência concreta à invenção ou ao delírio.

Como se pode ver, é um método tão velho quanto andar pra frente. Mas estamos aí para continuar de olho e expor essas artimanhas opressoras contra nós.

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