Bolsonaro: o mal obscuro e a transgressão de valores fundamentais

Reflexões sobre a ascensão de Bolsonaro e os danos irreparáveis à sociedade brasileira

Um dos argumentos frequentemente usados pelos eleitores de Bolsonaro é a ideia de que, enquanto o PT representava um “mal certo”, Bolsonaro seria um “mal incerto”, algo que, embora percebido como perigoso, ainda poderia trazer alguma esperança. No entanto, a verdade é que, para aqueles que estão sofrendo as consequências da ascensão de Bolsonaro, essa visão está completamente equivocada. Se o PT, com suas falhas, representava um mal certo e definido, Bolsonaro é, na realidade, um mal obscuro, oculto e profundo, cujo impacto no Brasil é imensurável.

A comparação com o incêndio no Museu Nacional ajuda a ilustrar o tipo de destruição que Bolsonaro representa. Seu rastro de devastação vai além das perdas materiais, afetando a herança científica, cultural, histórica e humana da sociedade brasileira. Como o incêndio que destruiu o acervo de um dos museus mais importantes do país, Bolsonaro também está queimando as bases que sustentam o Brasil enquanto nação, substituindo valores fundamentais por discursos de ódio, destruição e negação da realidade.

O fenômeno que define Bolsonaro é a inversão dos valores entre o Bem e o Mal, entre a Verdade e a Mentira. Em vez de ocultar o mal, como o PT, que negava suas falhas, Bolsonaro transforma o mal em bem, tratando ações profundamente prejudiciais como se fossem positivas. Enquanto o PT manteve a corrupção como algo reconhecível e, portanto, condenável, Bolsonaro, em suas falas e atitudes, muda o conceito do mal para um ponto onde ele se torna aceitável ou até desejável. Ele transforma o “não matarás” em “matarás”, o “não discriminarás” em “discriminarás” e o “não censurarás” em “censurarás”, aplicando um método que distorce e banaliza esses conceitos.

O governo Bolsonaro é a personificação do “Mal Infinito” descrito pela filósofa Hannah Arendt, no qual os limites entre o certo e o errado desaparecem. Essa transgressão dos valores éticos fragiliza o pensamento, tornando a culpa um conceito desprovido de qualquer sentido. O mal, ao perder seus limites, se espalha como uma infecção, já não sendo reconhecido como tal. Isso é o que Arendt descreveu como a “Banalidade do Mal”, um fenômeno visto pela primeira vez no nazismo, onde as atrocidades eram cometidas por pessoas comuns que não viam mais as ações como erradas, mas apenas como parte do sistema.

A situação brasileira não pode ser reduzida a uma disputa política entre dois projetos. Em 2018, Fernando Haddad representava um projeto falho, com falhas evidentes, mas ainda com o potencial de ser reformulado e corrigido. Já Bolsonaro não representava um projeto, mas uma transgressão pura e violenta dos princípios do Bem. No segundo turno eleitoral, a responsabilidade de preservar a capacidade de pensar claramente estava em jogo. Haddad era um candidato com quem se podia discordar, com quem se podia debater. Bolsonaro, no entanto, representava o “skandalon”, palavra grega que significa “obstáculo” – algo contra o qual não há mais oposição possível, um ponto de ruptura no qual o pensamento e a ação se tornam impotentes.

A ascensão de Bolsonaro ao poder não é apenas uma questão de política. Ela marca uma ruptura com as bases fundamentais da ética e da moralidade, e seu impacto vai muito além das questões eleitorais. O movimento #EleNão e o apoio a Haddad refletem a tentativa de preservar um mínimo de racionalidade e valores, resistindo à transgressão que Bolsonaro representa para a sociedade brasileira.

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