O impacto das sequelas da Covid-19 e o desafio do acompanhamento pós-infecção

Sequelas físicas e mentais após a infecção por Covid-19 e a subnotificação de óbitos seguem sendo desafios para a saúde pública no Brasil, exigindo mais atenção para um acompanhamento efetivo dos recuperados e um fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS).

Além dos impactos imediatos da pandemia, um dos temas que vem sendo negligenciado é o das sequelas deixadas pela Covid-19. Os pacientes que se recuperam da infecção enfrentam um novo conjunto de desafios, com sintomas como dores articulares, fadiga extrema, distúrbios do sono, doenças cardíacas, renais, hepáticas, perda de memória, além de uma gama de distúrbios comportamentais e de humor. Estes efeitos podem afetar diretamente a qualidade de vida dos recuperados, e o acompanhamento adequado é essencial para mitigar os danos a longo prazo.

Ao mesmo tempo, a questão da subnotificação de casos e óbitos permanece uma realidade preocupante. Embora a subnotificação de casos seja mais facilmente corrigível por meio de pesquisas de prevalência que investigam a presença de anticorpos, a subnotificação de óbitos é um problema mais complexo. Estudos indicam que a mortalidade por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) aumentou consideravelmente durante a pandemia, com uma subnotificação de óbitos que pode variar de 30% a 50%. Isso significa que o número real de mortes por Covid-19 no Brasil pode ser significativamente maior do que o reportado oficialmente, elevando o total de óbitos para algo entre 320 e 370 mil.

Recentemente, um estudo conduzido por um grupo de profissionais de renome, de hospitais como o Albert Einstein e Sírio-Libanês, trouxe à tona dados alarmantes. O estudo revelou que 25% dos pacientes intubados com Covid-19 morrem devido às sequelas da doença até seis meses após a alta hospitalar. Além disso, 40% dos pacientes que estiveram na UTI precisam ser readmitidos devido a complicações pós-infecção. A mortalidade entre os pacientes internados, mas não intubados, foi de 2%. Esses dados destacam que as mortes não se limitam apenas ao período agudo da doença, mas continuam a ocorrer devido às sequelas que podem durar meses.

Dessa forma, o cálculo da mortalidade da Covid-19 precisa incluir essas mortes subsequentes, relacionadas às sequelas da doença. Isso não apenas é crucial para entender a real dimensão da pandemia, mas também é um direito da sociedade conhecer a verdadeira tragédia sanitária que estamos enfrentando. Além disso, essa conscientização é fundamental para que o sistema de saúde se prepare para fornecer o devido acompanhamento pós-infecção, especialmente aos mais de 9 milhões de recuperados que necessitam de cuidados contínuos.

O SUS, com sua vasta experiência em acompanhamento clínico longitudinal, é a principal rede responsável por esse atendimento, com a colaboração de equipes de saúde da família e agentes comunitários. Contudo, a criação de um programa de atenção específico para as sequelas da Covid-19 exigiria uma estrutura organizada, com formação especializada para lidar com a variedade e a gravidade das sequelas. Isso representa um desafio adicional para o Sistema de Saúde, especialmente diante do atual cenário político e da falta de apoio do governo federal para enfrentar essa crise.

Outro ponto preocupante é a recente notícia sobre o aumento da mortalidade de pessoas abaixo de 60 anos, que passou de 23% para 25%. Isso sugere que o perfil dos indivíduos mais vulneráveis ao coronavírus pode estar mudando, com um número crescente de jovens sendo afetados, principalmente devido à disseminação das variantes do vírus, como as variantes P1, P2 e a variante britânica. Esse cenário é alarmante, pois reforça a necessidade urgente de vacinar toda a população, não apenas os grupos mais vulneráveis.

A vacinação segue sendo a principal estratégia para controlar a pandemia, e a priorização dos grupos de risco deve ser acompanhada de uma expansão rápida para garantir a imunização de todos. O aumento da mortalidade entre menores de 60 anos destaca a urgência de vacinar o maior número possível de pessoas, independentemente de sua faixa etária, para evitar que novas variantes do vírus afetem populações mais jovens e saudáveis. O sistema de vacinação, no entanto, tem enfrentado obstáculos devido à escassez de vacinas, o que tem gerado distorções na priorização e prejudicado o andamento do processo de imunização.

O momento é crítico, e o fortalecimento do SUS, o aprimoramento do acompanhamento pós-Covid e a expansão da vacinação são medidas essenciais para minimizar as sequelas físicas e sociais deixadas pela pandemia. A sociedade precisa estar atenta à gravidade da situação e exigir ações concretas para proteger a saúde de todos os brasileiros.

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