Morre-se da Covid-19 e de suas sequelas

Entre os temas que têm sido negligenciados nessa pandemia está o das sequelas deixadas pela Covid-19. Dores nas articulações, fadiga, distúrbios do sono, cardiopatias diversas, doenças renais, hepáticas, cardiopatias, perda de memória e também um gama de distúrbios de comportamento e humor. Quem está lendo a lista certamente se recordará de outras.

Outro tema ainda não equacionado sobre a pandemia é a questão da subnotificação de casos e óbitos. A de casos mais relativamente fácil de resolver ou de se ter consensos para a correção, que são as pesquisas de prevalência a partir da presença de anticorpos.

No caso das mortes é mais complicado, mas um dos caminhos tem sido considerar a serie histórica de mortes por síndrome respiratória aguda grave, a SRAG, e verificar o quanto aumentou no período da pandemia, descontando-se os casos comprovados de Covid-19. Sem outras causas comprovadas para essas mortes, é possível concluir que uma parcela importante delas se deveu ao novo coronavírus. O fato é que diversos estudos, com esse ou outros métodos, apontam uma subnotificação entre 30 a 50%, o que elevaria o nosso total de óbitos para algo entre 320 e 370 mil.

O estudo divulgado hoje pela Folha de certo modo junta os dois temas. Conduzido por um grupo de profissionais de 8 hospitais de excelência, entre eles o Albert Einstein e Sírio-Libanês, apontou que 25% dos pacientes intubados com Covid-19 morrem por sequelas até seis meses após alta e 40% dos pacientes que estiveram na UTI precisam ser internados novamente. Dos internados e não entubados a mortalidade foi de 2%. Ou seja, além das mortes causadas no curso da doença, temos as mortes causadas pelas sequelas deixadas pela doença e é bom ressaltar, não pelo procedimento de intubar que alias só é feito quando é imprescindível.

O cálculo da mortalidade da doença deverá levar em consideração essas mortes. Isso é sem dúvida importante por muitas razões, que vão da necessidade de conhecer mais profundamente a doença e a pandemia até o direito da sociedade em saber de fato a real dimensão da tragédia. Pelo direito a verdade para que se faça justiça. Mas também é muito importante pensar na linha de cuidado e acompanhamento pós ter adquirido a Covid-19.

Os chamados recuperados já passam de 9 milhões e considerando que mesmo ter tido casos leves da doença não é garantia de não ter sequelas duradouros, temos um enorme contingente de pessoas que deveriam estar cadastradas e recebendo orientações e cuidados permanentes. Obvio que isso é tarefa do SUS e sua rede de atenção básica, saúde de família e agentes comunitários de saúde.

O SUS está equipado para isso, tem expertise em acompanhamento clínico longitudinal. Mas tudo isso precisaria ser formatado como um programa de atenção específico, com formação especializada, até mesmo por conta da variedade das sequelas e pelas diferentes gravidades que apresentam. Mais um desafio que certamente não será enfrentado pelo atual governo. Mais uma luta da sociedade brasileira e defesa da saúde pública e por um SUS que cuide integralmente de toda a população brasileira.

Para não deixar de falar de vacinação, vejam a preocupante notícia de ontem, informando que as mortes de pessoas abaixo de 60 anos registram alta pela primeira vez desde o inicio da pandemia. A variação não é tão grande, de 23% para 25%, ou seja, a cada 4 mortes por Covid-19, 1 é de pessoa abaixo de 60 anos. O que preocupa mais? É que pode estar acontecendo uma mudança no perfil dos chamados mais vulneráveis ao vírus em direção a faixas etárias menores, como consequência da presença das variantes P1 e P2 e da chamada variante inglesa, já detectadas em vários regiões do país.

É bom atentarmos ao fato de que as prioridade inicial da vacinação é de idosos acima de 74 anos na fase 01, além de profissionais da linha de frente do combate à pandemia. Prioridade refeita e fatiada começando em alguns lugares com idosos acima de 90 anos. Isso por conta da escassez de vacina, para se criar um limitador, e não por critérios epidemiológicos. A notícia de aumento da mortalidade para menores de 60 anos indica que a urgência de vacinar toda a população é ainda maior.

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