Lamento e Memória: Gelson Reicher, uma vítima da ditadura militar de 1964

No dia 31 de março de 2021, enquanto o Brasil lembrava os 57 anos do golpe militar de 1964, a imagem de Gelson Reicher, um jovem militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), foi trazida à tona. Sua vida e morte marcam um capítulo doloroso da história do país, em que tantos perderam suas vidas ou ficaram marcados pela violência do regime.

Gelson Reicher – Wikipédia, a enciclopédia livre
GELSON REICHER. Fonte: Wikipédia

GELSON REICHER

Dados Pessoais
Nome: Gelson Reicher
Data de nascimento: 20 de fevereriro de 1949
Local de nascimento: São Paulo – SP – Brasil

Organização Política: Ação Libertadora Nacional (ALN)

Dados biográficos

Gelson Reicher nasceu em São Paulo, em 20 de fevereiro de 1949. Filho de Berel e Blima Reicher, Gelson não era apenas um estudante de Medicina na USP, mas também um ativista apaixonado pela luta por liberdade e justiça social. Como diretor do Centro Acadêmico Osvaldo Cruz e envolvido em diversas atividades culturais e políticas, ele foi um exemplo da juventude que se levantava contra a repressão imposta pela ditadura.

Ele também se destacou no teatro universitário, compondo músicas e escrevendo peças que foram encenadas e dirigidas por ele. Em sua trajetória, foi um dos responsáveis pela criação dos jornais 1º de Maio, Ação e O Guerrilheiro, veículos importantes de comunicação para o movimento revolucionário da época.

Entretanto, a trajetória de Gelson foi interrompida de maneira trágica em 20 de janeiro de 1972, quando ele foi morto em circunstâncias nebulosas pelas forças de repressão do regime militar. A versão oficial sobre sua morte, divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo em 22 de março de 1972, apresentava uma narrativa de confronto entre militantes e policiais. Segundo a versão, Gelson e seu companheiro Alex de Paula Xavier Pereira foram mortos em um tiroteio depois de um suposto desrespeito ao sinal vermelho, e a alegação de que ambos seriam terroristas.

No entanto, a versão oficial não resistiu ao tempo e à investigação. Com a abertura dos arquivos do Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP) em 1992, novos elementos foram descobertos, incluindo fotos dos corpos de Gelson e Alex, que sugeriam evidentes sinais de tortura. Laudos necroscópicos e depoimentos indicaram que a morte dos dois não foi resultado de um tiroteio, mas sim de uma execução sumária após torturas.

Em 1996, um novo laudo realizado pelo médico legista Nelson Massini confirmou a versão de que Alex de Paula Xavier Pereira havia sido torturado antes de ser morto. A tortura, segundo Massini, não era apenas física, mas uma estratégia do regime para calar a resistência e apagar as vozes dissonantes. Gelson, por sua vez, foi enterrado sob o nome falso de Emiliano Sessa, mas sua família conseguiu recuperar seu corpo logo após a morte, em meio a uma luta constante para preservar a memória e a verdade sobre a sua perda.

Gelson, como tantos outros, foi uma vítima do regime militar que perseguiu, torturou e matou aqueles que se opunham à ditadura. Hoje, passados quase 50 anos, sua memória ressurge como um lembrete da luta pela liberdade e pelos direitos humanos. Ao lembrar de sua história, estamos não apenas homenageando a sua vida e coragem, mas também mantendo viva a chama da resistência contra as injustiças e o autoritarismo.

Sua memória permanece como um farol para as gerações futuras, mostrando que, mesmo diante da repressão, a busca pela verdade e justiça nunca deve ser abandonada. Gelson Reicher e outros como ele são símbolos da resistência, e sua história não deve ser apagada, mas lembrada, para que possamos aprender com os erros do passado e evitar que a história se repita.

Equipe de governo de Vargas, em que vemos Jango / Crédito: Wikimedia Commons

A morte de Gelson Reicher e a ocultação da verdade: investigações e testemunhos

O caso de Gelson Reicher, militante da Ação Libertadora Nacional (ALN) morto pela repressão durante a ditadura militar, envolve um conjunto de questões obscuras e misteriosas que exigem investigação profunda. O envio de corpos, necropsias realizadas sem testemunhas e os procedimentos que levaram à identificação falsa de Gelson revelam a complexidade do processo de ocultação da verdade durante o regime.

Gelson Reicher, um jovem estudante e militante político, foi morto em 1972, em um contexto de forte repressão por parte do regime militar. A versão oficial, como foi amplamente divulgada na época, descrevia sua morte como consequência de um tiroteio entre policiais e “terroristas”, mas essa narrativa se mostrou, com o tempo, inconsistente e manipulada. Vários depoimentos e documentos revelaram falhas e distorções no processo de identificação e sepultamento de seu corpo, que foi enterrado com um nome falso em Perus, um cemitério da cidade de São Paulo.

A versão de que o corpo de Gelson foi enviado com nome falso pelos órgãos de repressão e que a necropsia foi realizada de maneira questionável foi confirmada por diversas investigações e depoimentos, incluindo o de Isaac Abramovitc, médico legista e amigo de Gelson desde a infância. Abramovitc foi o responsável pela autópsia do corpo, mas, apesar de sua proximidade com a família, emitiu um laudo com o nome falso e permitiu que o corpo fosse enterrado como indigente. Esse fato gerou questionamentos sobre a verdadeira motivação e as circunstâncias da morte de Gelson, que, além de ter sido assassinado, teve sua identidade oculta pelo regime.

O próprio Abramovitc, em depoimento, não conseguiu explicar os motivos pelos quais não reconheceu o rosto de Gelson durante a necropsia, apesar de conhecê-lo pessoalmente. Ele alegou que o corpo estava tão desfigurado que não conseguiu fazer a identificação, mas a foto do cadáver mostra claramente que o rosto de Gelson não estava deformado, o que reforça a suspeita de que houve uma tentativa deliberada de ocultar a identidade da vítima. Outro aspecto intrigante do caso foi o fato de Gelson e seu companheiro de militância, Alex de Paula Xavier Pereira, terem sido enviados ao necrotério do Instituto Médico Legal (IML) apenas com cuecas, levantando questionamentos sobre o tratamento e a brutalidade a que foram submetidos após suas mortes.

Além disso, a morte de Gelson só foi oficialmente divulgada 48 horas depois do ocorrido, o que, por si só, já revela indícios de manipulação e encobrimento. A diferença entre a versão oficial e as evidências encontradas ao longo dos anos mostra que o processo de ocultação da verdade foi uma prática sistemática do regime militar para descreditar a luta política e esconder os crimes cometidos contra os opositores do governo.

A investigação posterior à abertura dos arquivos da Comissão Nacional da Verdade revelou uma série de irregularidades, e a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) foi acionada para analisar os casos de Gelson e Alex. Em 1997, a CEMDP concluiu que, embora o caso de Gelson envolvesse uma morte em confronto armado, como no caso de Alex, a análise técnica das lesões apresentadas pelos corpos de ambos revelava que os dois militantes foram vítimas de tortura antes de suas mortes. O laudo do perito criminalista Celso Nenevê detalhou as lesões não descritas no laudo inicial de Abramovitc, confirmando que Gelson, assim como Alex, havia sido brutalmente torturado antes de ser executado.

Em um dos pontos mais críticos do laudo, foi constatado que Gelson apresentava lesões em áreas como a região orbitária e frontal, com edema traumático e equimose, evidências de que ele foi agredido antes de ser morto. A ausência de uma explicação oficial para tais lesões e a omissão de informações cruciais durante a necropsia indicam que as autoridades estavam envolvidas em um processo deliberado de encobrimento dos crimes cometidos.

A investigação do caso de Gelson Reicher, juntamente com a de outros militantes mortos pela repressão, continua a ser um marco na busca pela verdade e justiça sobre os crimes da ditadura militar. O esclarecimento de sua morte é essencial para entender os abusos de poder cometidos pelo regime e para dar voz às vítimas que, durante décadas, foram silenciadas e apagadas da história oficial. Gelson e outros como ele merecem ser lembrados, não apenas como vítimas, mas como heróis de uma luta por um Brasil mais justo e democrático.

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Policiais agredindo um civil – Wikimedia Commons

A verdade sobre a morte de Gelson Reicher: lesões e homenagem póstuma

O caso de Gelson Reicher, militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), que foi morto pela repressão militar, revela novas evidências de violência extrema e encobrimento de sua morte. As lesões observadas em seu corpo indicam tortura após os ferimentos fatais, e as investigações revelam detalhes importantes sobre os métodos usados pelos agentes de repressão.

Gelson Reicher, como outros militantes durante a ditadura militar, foi brutalmente assassinado e teve sua morte manipulada pelas autoridades. A investigação forense da época e os laudos médicos indicaram que a formação das lesões em seu corpo não estavam relacionadas diretamente aos projéteis que atingiram sua cabeça, mas possivelmente ao uso de um instrumento contundente, sugerindo que ele sofreu uma agressão física severa após já ter sido alvejado.

O exame do corpo de Gelson revelou detalhes importantes sobre as lesões que ele sofreu. As manchas escuras na linha mediana da região frontal, no dorso do nariz e na região orbital esquerda indicavam um possível uso de um instrumento, mas a natureza exata das lesões não pôde ser identificada com precisão. Essas marcas estavam localizadas em áreas do corpo que sugerem um contato físico próximo, o que implica em uma tortura intencional, uma vez que Gelson já estava ferido e aparentemente incapaz de resistir ou fugir após os tiros nos membros.

O exame ainda revelou que a lesão na região orbital direita, associada a um edema e equimose, era de natureza contusa. Para que essa lesão fosse formada, era necessário um contato direto entre o instrumento e a vítima, o que reforça a teoria de que Gelson foi torturado após ter sido baleado e já não oferecia resistência. Esse tipo de ferimento é incomum em casos de tiroteios, indicando que as circunstâncias de sua morte foram muito mais complexas do que a versão oficial da repressão militar, que atribuía sua morte a um confronto armado.

A possibilidade de que Gelson tenha sido torturado após já ter sido baleado reflete uma prática comum durante a ditadura militar, em que opositores eram frequentemente submetidos a torturas físicas antes de serem executados. Esses detalhes são fundamentais para entender a brutalidade e o grau de violência que caracterizaram o regime militar e a forma como as vítimas eram tratadas, tanto durante a morte quanto após a mesma.

Em 1997, a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) reconheceu a morte de Gelson Reicher como um caso de execução extrajudicial, aprovando o relatório que descrevia sua morte como resultado de uma repressão violenta. Apesar de um voto contrário, o caso foi aprovado por 6 votos a 1, o que representou uma importante vitória na luta por justiça para as vítimas da ditadura militar.

Além da luta judicial, Gelson Reicher foi homenageado postumamente em várias iniciativas. Em 2007, foi inaugurado um memorial em sua homenagem na sede do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz (CAOC), em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH-PR). Gelson também foi lembrado no bairro Jardim da Glória, em São Paulo, onde uma praça recebeu seu nome, e no Rio de Janeiro, com a criação de um centro de atendimento da Secretaria do Trabalho, denominado “Agência Irmãos Iuri e Alex Xavier Pereira”, em homenagem aos militantes que morreram durante o regime.

Essas homenagens representam um esforço para manter viva a memória das vítimas da ditadura militar e promover a reflexão sobre os abusos cometidos durante esse período sombrio da história do Brasil. O caso de Gelson Reicher, com todas as suas nuances de tortura e manipulação, é um exemplo claro da violência estatal que marcou a repressão a militantes e opositores políticos, e sua história deve ser lembrada como parte do processo de justiça e reconhecimento das vítimas da ditadura.

FF: Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil 1964-1985. IEVE- Instituto de Estudos Sobre Violência do Estado e Imprensa Oficial, São Paulo, 2009.

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