A farsa intencional da política brasileira

Apesar das problematizações possíveis do mito de Pandora, é inegável como essa representação do grande mal que cresce numa espiral sem fim é precisa para vários momentos da história. Pandora, a primeira mulher mortal, artifício de Hefesto a mando de Zeus e Hera, carregava uma caixa que continha todos os males da humanidade (doenças, fome, guerras).

Absorta pela curiosidade e malícia, desobedece a recomendação de não abrir a caixa, liberando essas males na Terra, com exceção da esperança, que segue guardada na caixa.

Quando assistia à atuação perversa e teratológica de Moro na Lava Jato e seu tribunal de exceção sobre Lula, vi ali um germe do fascismo brasileiro, que seguia a esteira das manifestações “contra todos os partidos políticos”, que virou “contra todos os partidos de esquerda” de 2013/2014. Sob a égide do “urgente combate à corrupção”, ultrapassou-se todas as linhas de proteção do Estado democrático de direito para concluir um objetivo político pessoal e coletivo do lavajatismo: prender Lula e impedir sua reeleição em 2018.

O próprio golpe de Estado que Dilma Rousseff sofreu em 2016, num impeachment sem lastro legal de crime de responsabilidade, absorveu os impactos políticos do projeto midiático sensacionalista, amparado pela imprensa hegemônica brasileira sem compromisso histórico com a democracia, da Lava Jato.

A cumplicidade coletiva do sistema judiciário brasileiro e da sociedade civil com as teratologias da Lava Jato, impedindo a eleição do político mais popular do país depois de um golpe, criou uma sequência de dificuldades que impediam lutas e resistências para conter uma candidatura de Bolsonaro, sua eleição repleta de propagação de fake news via dispositivos digitais, e seus gestos autoritários e que rasgam a constituição de 88 ao longo do seu mandato.

O extermínio da população brasileira com a gestão da pandemia da Covid-19, que intencionalmente agiu por propagar o vírus e promover a “imunidade de rebanho” é a consequência última de inúmeras rupturas que o Estado Democrático de Direito sofreu com as ações de Sergio Moro na Lava Jato.

Hoje o STF decidiu pela suspeição de Moro no caso de Lula, algo óbvio e ululante ao longo de todo processo, visto que Moro tinha clara predileção política e se tornou ministro do governo que ele ajudou a eleger.

Isso mesmo que vagarosamente recoloca as coisas no lugar. Reconcilia a realidade com a verdade e encerra a caixa de Pandora, trazendo a esperança novamente à mesa. Todo grande mal começa a acabar com essas reconciliações.

Acredito que este seja o primeiro passo para uma futura condenação de Bolsonaro por crimes contra a humanidade em sua gestão, o que é imprescindível para o Brasil se reaver com sua jovem democracia, produzindo memória e verdade sobre esse período sombrio que vivemos.

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