As reações extremas à derrota da seleção revelam um desconforto humano maior, que pode ser explicado pela busca por algo além do entretenimento e do ego elevado.
A recente derrota da seleção brasileira na Copa do Mundo, acompanhada de momentos de descontração e alegria, trouxe à tona uma faceta mais sombria de parte da população: a violência, as depredações, as prisões e até ameaças de suicídio. Esses episódios, que fogem ao escopo do que poderia ser considerado uma reação esperada a uma derrota esportiva, revelam uma complexidade psicológica mais profunda. Elas refletem não apenas uma tristeza momentânea, mas um vazio existencial e um super-apego a um evento cuja natureza é, no fim das contas, trivial.
Nesse contexto, é possível lançar mão da filosofia de Jean-Paul Sartre para compreender o que se passa na mente de quem reage de forma desproporcional a eventos como a derrota de um time de futebol. Sartre falava da “impossibilidade do Real”, algo que, à primeira vista, parece abstrato. Segundo ele, a impossibilidade de mudança é, por si só, uma impossibilidade superável, e é neste espaço de desconforto que o ser humano encontra força para transformar sua realidade. Ou seja, a extrema tristeza e até a violência resultam da sensação de que a realidade – em sua forma intransigente e imutável – ameaça a própria vida, exigindo uma transformação diante da impossibilidade de superação da situação.
É precisamente essa relação entre a realidade e o desejo de superação que se manifesta após a derrota da seleção. O futebol, sendo uma forma de entretenimento e uma válvula de escape emocional, não deveria desencadear reações tão intensas. Mas é exatamente a imersão exagerada das pessoas nesse fenômeno que revela o tamanho do vazio existencial de muitos indivíduos. O futebol, em vez de ser uma simples diversão, passa a ser uma questão de vida ou morte emocional. As reações extremas não são motivadas pela derrota em si, mas pela incapacidade de lidar com a frustração da expectativa, que tem suas raízes em algo muito mais profundo.
A desilusão que se segue à derrota de um time como a seleção brasileira é marcada por um apelo ao ego, um super-apego àquilo que é, no fim das contas, apenas um entretenimento. A incapacidade de lidar com a tristeza e a perda do time de futebol pode ser vista como uma reação desproporcional ao evento em si, mas, sob uma análise mais profunda, evidencia a fragilidade de um sujeito que se vê ancorado em uma referência que não tem uma função social objetiva. O futebol, ao invés de ser uma simples celebração da competição e do talento, se torna uma espécie de válvula de escape para um vazio existencial.
Esse estado de desespero, que parece deslocado da realidade, é uma forte evidência de como muitas pessoas buscam preencher o vazio com algo superficial, como o futebol. O super-apego ao time, nesse sentido, é a manifestação de uma tentativa desesperada de encontrar um sentido em algo que não tem maior valor, como uma tentativa de preencher a lacuna deixada pela falta de objetivos maiores e mais profundos na vida. A reação que vai do niilismo à violência é uma tentativa de transitar entre a realidade insatisfatória e a busca por um novo estado de ser, que não encontra respostas em si mesma.
Portanto, a extrema reação à derrota da seleção não é apenas um sintoma da superficialidade do apego ao futebol, mas uma manifestação da profunda insatisfação com a vida e da incapacidade de lidar com a realidade. A busca por algo maior, que vá além do entretenimento, é o que parece faltar, e é nesse espaço de vazio existencial que se originam as reações mais destrutivas e desesperadas.