O vazio e o nada

Ainda há descontração e alegria após a bancarrota da seleção brasileira, o que, como dizem, remete-nos a um senso puro de “espírito esportivo”, mas o choro e a violência que também atravessou o país, incluindo depredações, prisões e até ameaças de suicídio, por conta da derrota evidencia-nos um curioso diagnóstico sobre boa parte dos brasileiros.

Arriscando-me na filosofia, lembro de uma relação desvendada por Sartre entre o desconforto humano e a “impossibilidade do Real”. Para Sartre, o Real – como sentido daquilo que é, por princípio, impossível – abre lugar para a transformação no momento em que a impossibilidade de mudar é ela mesma impossível.

Em outras palavras, as reações humanas mais destrutivas, como a extrema tristeza e alguns episódios de violência, emergem a partir da ameaça que a própria realidade fornece à vida, caso não seja superada. A tristeza, assim, é um estado de espírito inquieto, por onde o ser adquire forças para alterar o conjunto existencial que se mostra profundamente insatisfatório.

Perceber esses traços de reação após uma partida de futebol nos suscita, entretanto, uma desproporção óbvia entre o fato em si e o que a Copa do Mundo, como entretenimento, pode oferecer objetivamente: no limite, uma elevação do ego a partir da transferência para o time. Percebam que o mais curioso não é, neste momento, o dissabor de uma derrota, mas, decerto, o estado de desespero visto nas imagens.

Se podemos identificar o núcleo da Copa como fútil para nos super-apegarmos a ela, só nos resta concluir que o super-apego se dá a partir do estado vazio de seus sujeitos. A estranha desilusão frente ao jogo, num misto de niilismo e violência, é uma forte evidência da superficialidade do que molda a vida e as “possibilidades do Real” dessas pessoas.

Destituídas de qualquer função social objetiva, percebem a iminência do vazio existencial mediante o menor dos fenômenos, reagindo a ele por meio de um impulso, no máximo, histriônico, que vem do meio do nada e vai em direção a lugar nenhum.

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