As facetas das manipulações por trás da política

Hoje a página “Orgulho de Ser Hétero” caiu, mais uma vez, assim como outras páginas de “figuras pulicas” que têm se projetado pessoalmente a partir da defesa do senso comum e da resistência do preconceito. E há quem já esteja se manifestando e tratando essa tardia atuação da administração do Facebook como uma “ditadura”. De fato, é uma tradição daqueles que só se empenham em tornar a vida dos outros pior chamar a reação dos insultados de violência.

Vamos lá. Todo movimento emancipatório tem como objetivo destacar o sujeito das amarras sociais sobre sua natureza. O movimento liberal-iluminista tinha como objetivo destacar a razão das amarras religiosas de seu tempo. O pensamento de Galileu Galilei talvez já predizia o cerne do que seria o futuro iluminismo.

“Não se pode ensinar nada a um homem; só é possivel ajudá-lo a encontrar a coisa dentro de si”

Ora, isso vai totalmente de encontro ao modus operandi religioso, que presumia a razão como externa, introjetada pela palavra de Deus e submissa a esses preceitos, não fruto interior do exercício da razão e da subjetividade livre.

O movimento existencialista, onde o feminismo encontrou um de seus maiores pilares, tinha como objetivo destacar a mulher dos ditames jurídicos, morais e sociais de seu tempo. O famoso “torna-se mulher” de Beauvoir é um instrumento epistemológico para destacar a mulher de uma ontologia biológica, psicológico e social que justificava sua ausência de direitos e seu papel inexorável na sociedade. Tratar a “mulher” como um produto, não como um ser em si mesmo, era imprescindível para dar base à busca pela liberdade.

Ainda hoje, e com elevada expressão no Brasil – este “Ornitorrinco”, como chama Chico de Oliveira, que carrega sincretismos históricos incompatíveis e ainda tem em seu bojo, de fato, um pouco de Idade Média – há diversas amarras sociais sobre as liberdades individuais.

E estamos falando de liberdades de comportamento que dizem respeito, no campo material, apenas ao sujeito consigo mesmo. Há de fato uma iniciativa de usar a esfera pública como uma forma de interferir na vida privada, de desestimular, por meio de dificuldades na convivência com o outro, deliberações livres do sujeito sobre seu próprio corpo.

Uma página como “Orgulho de ser hétero” tem como objetivo apenas afirmar o valor heterossexual sobre as demais sexualidades; valor este que na era moderna foi utilizado para coibir liberdades e tornar insuportável ter uma sexualidade diferente da heterossexual.

O movimento emancipatório atual quer tanto resgatar a “subjetividade livre” contra o fundamentalismo, quanto o caráter de “produto”, de não-ontologia, da supremacia heterossexual.

Quem chama isso de ditadura inverte totalmente a lógica e trata a perda do controle sobre os demais e a valorização da pluralidade como uma afronta à norma, ao padrão que o sustentava como centro do status e do poder.

Eles não percebem que certas proibições são produtos do movimento da liberdade e que justamente a resistência em acatar a emancipação individual é que pode ser chamada de ditadura, de opressão, de uso da esfera pública contra as particularidades individuais.

Viva à proibição da página “orgulho de ser hétero”, entre outras, que garante o orgulho dos demais em exercer a sua liberdade.

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