As lutas sociais surgem em momentos de crise, quando os valores e estruturas estabelecidos começam a ser questionados. Mesmo que algumas ações sejam vistas como violentas ou desordenadas, a validação de uma luta depende da perspectiva dos grupos que enfrentam a opressão.
Pensar sobre a validade de uma luta é complexo, pois ela está intrinsecamente ligada a um momento histórico em que um determinado grupo social começa a perceber sua própria condição como insustentável. Quando uma classe social se vê sem alternativas e sem apoio dentro da ordem vigente, qualquer movimento que busque mudar essa realidade se torna válido a partir de sua própria perspectiva. A luta é, assim, uma reação à opressão, e essa reação precisa ser entendida no contexto de quem a trava.
A questão da moralização das manifestações sociais é um ponto crítico. A forma como a sociedade vê uma luta e os meios utilizados para defendê-la muitas vezes é determinada pela estrutura dominante, que molda o que é considerado certo e legítimo. No entanto, essa visão é frequentemente ideológica e serve apenas para preservar a ordem existente. A luta dos oprimidos, ao contrário, é marcada pela necessidade de contestar essa estrutura e seus valores, que nem sempre são éticos ou justos.
Walter Benjamin, ao refletir sobre a violência e a luta, trouxe uma contribuição importante para a compreensão dos movimentos sociais. Ele argumentava que a violência não era apenas uma ação física, mas uma forma de resistência contra uma ordem que nega os direitos dos oprimidos. Isso é visível nas manifestações de rua, como as que começaram em junho de 2013 no Brasil, que foram rotuladas de “violentas” ou “vandalismo” pela grande mídia e pelas autoridades. Esses rótulos têm o objetivo de deslegitimar as ações dos movimentos sociais, afastando o olhar crítico da sociedade sobre as estruturas de poder que as geraram.
Essas manifestações, e em particular as greves, são frequentemente vistas como problemas que devem ser resolvidos dentro dos limites da ordem estabelecida. No entanto, a verdade é que a própria ordem é auto-defensiva e foi construída para proteger os interesses da classe dominante. Quando as greves e movimentos sociais se conformam a essa ordem, suas ações muitas vezes se tornam ineficazes. A única forma de realmente desafiar a estrutura e criar uma mudança significativa é através da “não-ordem”, ou seja, através da ação direta e da ruptura com a norma que mantém a opressão.
A greve, por exemplo, é uma ferramenta poderosa quando usada corretamente, mas ela só se torna legítima quando vai além da simples paralisação do trabalho. Se a greve não causa um impacto significativo e perceptível, isso significa que ela não conseguiu atingir seu objetivo de questionar a estrutura que mantém o status quo. Portanto, quando as pessoas “invalidam” uma greve por ela ser considerada excessiva ou desnecessária, estão, na verdade, ignorando o fato de que a própria ordem só escuta quando a dor e o desconforto atingem uma parte significativa da sociedade.
Por isso, é importante refletir sobre o papel das greves e das manifestações sociais dentro de um sistema que, por natureza, tende a se proteger e a neutralizar qualquer tentativa de mudança. A luta contra a opressão é válida quando se reconhece que a estrutura não pode ser desafiada dentro da ordem, e que, muitas vezes, a “não-ordem” é a única forma de garantir que as vozes dos oprimidos sejam ouvidas.