No internato é possível ver quanto que os professores em alguns casos dão voz aos estudantes para que assim façam um ato radical de resistência dentro da tradição médica universitária.
É incrível como a hierarquia hospitalar infantiliza muitas vezes internos com mais de 30 anos de idade e ultrapassa a fronteira técnica das condutas médicas. Não raro são obrigados a ouvir opinião de médico assistente sobre assuntos quaisquer durante atividades hospitalares, e o estudante ter opinião adversa passa a ser visto como “estar na defensiva”. Aparentemente muitos deles tem que concordar sempre, caso contrário é arrogância.
Não raro também internos e residentes tornam-se progressivamente incapazes de tomar decisões éticas autônomas, precisando sempre consultar o superior, por mais óbvia que a verdade seja e que quem assine a conduta seja o interno e o residente, não o tal superior. E muito menos raro também vejo médico assistente e professor titular falando abobrinha enquanto todos ao redor ficam incapazes de contribuir para a não-abobrinha.
O hospital é de tal hierarquia que de fato é um lugar em que a capacidade de pensar se torna reduzida. E realmente fica uma pergunta como isso pode ser bom para a formação médica?
Estudantes de medicina são adultos, ainda que jovens, e estão em pleno funcionamento de suas faculdades mentais. Conhecimento técnico todos precisam, mas decisões éticas, próprias da relação médico-paciente, se aprimoram com o exercício. E para isso, antes de qualquer coisa, a pessoa precisa ocupar um lugar de sujeito pensante e maduro. E esse lugar só pode ser oferecido pela estrutura de ensino. Caso contrário, pensar se torna um ato de resistência.