Em meio à crise sanitária e econômica gerada pela pandemia, o Brasil enfrenta um dilema sobre as prioridades do governo e as consequências das suas escolhas para a população mais vulnerável.
O debate sobre o fim do período de isolamento social tem ganhado força, com defensores afirmando que o retorno à normalidade econômica é essencial para a sobrevivência financeira do país.
No entanto, muitos economistas alertam que a reabertura prematura das aglomerações sociais pode ter um impacto muito mais devastador na economia. Se o isolamento for suspenso antes do tempo, o número de mortes aumentará significativamente, o que, por sua vez, prejudicará ainda mais a economia, visto que perder cidadãos significa uma redução direta da força de trabalho e da produção econômica.
Em São Paulo, o governador João Doria anunciou que, a partir de 11 de maio, o estado começará a reabrir gradualmente, justificando a decisão com base na ciência. No entanto, a falta de testes suficientes para entender a real situação da saúde pública do estado levanta questões sérias sobre a viabilidade dessa reabertura. Sem dados adequados, qualquer medida de reabertura parece ser baseada em suposições e interesses políticos, não em evidências científicas. O temor é que, devido a ações impulsivas e eleitoreiras de autoridades, a população pague com suas vidas.

A desigualdade social brasileira se reflete diretamente na crise sanitária. Em muitas favelas e periferias, a disseminação do Covid-19 é muito mais intensa, e os efeitos da pandemia são mais devastadores. A sociedade brasileira já enfrenta uma grande disparidade entre as classes, e a pandemia apenas evidencia essas desigualdades históricas. A escravização da população negra, o genocídio indígena e as políticas públicas discriminatórias, como a “guerra às drogas”, contribuem para que as mortes por Covid-19 nas regiões mais pobres não sejam um acaso. Esses locais representam o produto de uma sociedade marcada por processos históricos de opressão e exclusão.
A reabertura de atividades sem a devida proteção social para a classe trabalhadora é imoral e injustificável. Mandar as pessoas de volta ao trabalho, sem condições adequadas de saúde e segurança, coloca suas vidas em risco. A classe trabalhadora, que sustenta a economia com o seu trabalho, não pode ser tratada como uma peça descartável para salvar uma economia que, na verdade, beneficia apenas os ricos. Os grandes empresários e as megacorporações, que possuem vastos investimentos em bancos internacionais e paraísos fiscais, não contribuem de maneira justa para a sociedade, e suas ações apenas perpetuam a desigualdade.
A verdadeira solução para a crise passa pela taxação das grandes fortunas e pela reavaliação da dívida pública, que atualmente é um peso excessivo sobre a população. Muitos argumentam que taxar as grandes fortunas pode gerar um êxodo de dinheiro para outros países, mas a realidade é que essas fortunas já estão no exterior, em bancos internacionais, e nem sequer retornam para o país. A classe rica, em vez de criar postos de trabalho, investe em especulação financeira, sem contribuir de maneira efetiva para o desenvolvimento social.
O sistema econômico atual, que privilegia a acumulação de riquezas nas mãos de poucos, gera miséria para a maioria da população. A classe trabalhadora, que produz e sustenta a sociedade, merece ser valorizada e ter suas necessidades atendidas de forma digna. A manutenção do status quo, que beneficia apenas uma minoria, resulta em um ciclo vicioso de pobreza, exploração e desigualdade.
A pandemia do coronavírus expôs as falhas do sistema e colocou em evidência a necessidade de uma mudança profunda na forma como a economia e as políticas públicas são estruturadas. Não podemos mais ignorar as desigualdades históricas que permeiam a sociedade. Devemos questionar se o sistema atual, que favorece os ricos e marginaliza os pobres, é sustentável ou se é hora de buscar um modelo mais justo e inclusivo. Como Paulo Freire nos ensinou, a base ideológica de uma sociedade deve ser inclusiva, e não excludente, se queremos realmente construir um futuro mais igualitário para todos.