Barreiras na sociedade

Chocantes são as imagens da operação da polícia militar na cracolândia. Chocantes pela brutalidade desproporcional, com uso de armas químicas e de fogo, contra sem-teto no mais alto nível de carências: gestantes, idosos, portadores de doenças crônicas, pessoas com deficiência, portadores de transtornos psiquiátricos, abandonados, miseráveis.

Chocante também é a escolha pelo desvio de recursos que poderiam ser utilizados para retirar essas pessoas da situação de rua em si e que foram direcionados para a pura violência, cujo único objetivo visível é dissolver a concentração de sem-teto da cracolândia pelo terror e promover uma aparência higienizada para o centro da cidade.

Dória (PSDB) não só atacou essa população com dezenas de bombas que custam 300 reais a unidade, como dispensou efetivos militares que farão patrulha permanente na região.

Além disso, decretou o fechamento e a demolição de todos os hotéis do programa “Braços Abertos” do prefeito anterior, Fernando Haddad, cujos terrenos serão direcionados para a construção de moradia pela iniciativa privada, que obviamente não serão moradia para os sem-teto, mas para a especulação imobiliária. Segundo o prefeito Bruno Covas (PSDB), em um gesto de presunção e ignorância estupenda, com esta operação absurda a Cracolândia “acabou”.

Operação surpresa de guerra na Cracolândia choca entidades e recebe  críticas – Justificando

É chocante que um prefeito considere que dissolver pessoas nesse extremo de abandono e miséria vá “acabar” com a “cracolândia” num sentido amplo. Ele na verdade, com o gesto, no máximo agravou o problema da moradia, porque até as pedras sabem (ou deveriam saber, por lógica) que a centralidade do problema dos moradores de rua é o preço dos imóveis e dos alugueis, ou seja, é a própria especulação imobiliária.

O esperado é que a cracolândia seja deslocada temporariamente, e essas pessoas no extremo da marginalização vão continuar nessa margem, fugindo do Estado, com suas dificuldades agravadas, e aumentando a criminalidade em outras regiões da cidade.

Qualquer sujeito pensante, capaz de distinguir o certo do errado, é capaz de perceber que essa operação deveria ser inconcebível. Ainda que fosse efetiva, o que definitivamente não é – já que saúde pública não se resolve com políticas de segurança –, ela não poderia ter sido levada a cabo.

O mal e o desespero que vemos nas imagens não são ações aceitáveis por uma sociedade. Acaba sendo simbólico e cínico que o projeto “Cidade Linda” tenha substituído o “Braços Abertos”, porque é realmente a substituição do acolhimento pela higienização. Pode até ser que a cidade assim fique mais apresentável para os olhos de alguns, mas não para a nossa consciência.

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