O exercício da advocacia em defesa dos direitos humanos é, muitas vezes, um aprendizado contínuo sobre lidar com derrotas processuais e as frustrações advindas das injustiças.
Na tarde de hoje, vivenciamos uma dessas derrotas dolorosas. Em um caso de estupro envolvendo uma jovem estudante de Medicina da USP de Ribeirão Preto, violentada pelo ex-namorado, a Justiça optou por ignorar a profundidade da violência vivida. Apesar da sustentação oral detalhada, onde expusemos as falhas do processo e o conluio para encobrir o crime, o Tribunal de Justiça de São Paulo reiterou a decisão de primeira instância, absolvendo o réu por “insuficiência de provas”.
O juiz inicial e os desembargadores adotaram a visão restritiva de que a ausência de marcas físicas ou reação explícita da vítima implica em consentimento, desconsiderando a violência psicológica e simbólica que caracteriza o estupro. Argumentos que mostraram como o réu manipulou os fatos foram descartados, reforçando uma narrativa que culpa a vítima e perpetua o machismo estrutural.
Estatísticas demonstram que a maioria das vítimas de estupro não reage durante a agressão devido ao medo de represálias mais severas, como homicídio. No entanto, esse contexto foi ignorado, e a palavra da vítima foi desprezada, substituída por uma busca fria e insensível por provas jurídicas tangíveis.
A realidade é que, em crimes de natureza sexual, racista ou homofóbica, a prova dos fatos é extremamente difícil de obter. A violência é premeditada, centrada no controle e posse do corpo da vítima, o que frequentemente resulta em decisões judiciais que falham em reconhecer a complexidade da violência de gênero.
Essa decisão reflete não apenas uma falha na Justiça, mas também uma validação do preconceito estrutural que marginaliza e silencia as vítimas. Quando preconceitos estruturais estão em jogo, o sistema judiciário muitas vezes trabalha contra as vítimas, deixando uma sensação de impunidade e desamparo.
A luta por justiça continua, e a necessidade de reformar o sistema judicial para que ele verdadeiramente proteja as vítimas de violência de gênero é mais urgente do que nunca. O reconhecimento da violência psicológica e simbólica, e a importância da palavra da vítima, são passos cruciais nessa jornada.